
Na época, ainda inexperiente e a despeito de sua sinceridade, o analista riu e foi mesmo até à galhofa: — Só por isso?! Êta exigência mais exigente a sua, não?! Sucesso em todos os papéis e acha que ainda é insuficiente: em uma palavra, exigência.
A pontuação não teve efeito quase algum, continuou ali, entristecido.
Hoje, depois de tantos anos, o terapeuta reconhece que não o compreendeu e, mais ainda, o desqualificou. O vazio de existir estava ali, na sua cara, e ele não o viu. Ele existia por existir, mas não se sentia vivo.
Assim como suas pretendentes, ele também ficara admirado e meio cegado por seus desempenhos, e não se deu conta de que os papéis, que com os anos amealhara e desenvolvera, constituíam-se somente em defesas adaptativas: formara um portentoso falso-self que estava falindo diante do mundo. Na verdade, sentia-se uma espécie de Cavaleiro Inexistente, como o de Calvino: vestido de armadura e glorificado por seus feitos, porém, quando convocado para relações verdadeiras, era um oco só.
Hoje, se atém mais à dor revelada pelo cliente, e não dá lá muita atenção às gravatas e bravatas.
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Esse texto foi publicado no antigo portal Psicorama em 04/11/2010, e editado para nova publicação aqui.
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